Saturno dar-te-á um empurrão.
Paro neste sofá, arde a minha mágoa.
Adormeço para o sonho, belisco-me no dedo mas não sei onde estou.
Névoa..
Abro os olhos, mas não abrando o coração.
Não mexo a cabeça, alguns segundos.
A paixão encaixa-me no tempo. Não tenho de fazer nada, espero.
O autocarro aproxima-se.
Não há condutor, um preto velho no último banco a sorrir. Mas as janelas são espelhos.
Vejo gente nos espelhos, mas estou só com o preto de dentes brancos.
O autocarro move-se na vertical, afinal é um elevador para o céu.
Devo estar a sonhar, não apareco no espelho.
Uma nuvem puxa o autocarro, vejo.
Há uma cidade dentro de um lago, vejo aqui de cima mas consigo tocá-la com os dedos que deixei para trás.
O preto acabou de sair, deu-me um sorriso, diz que hei-de precisar, ele tem muitos.
Não tenho rosto, a minha boca desapareceu. Não consigo responder.
Os meus olhos ficaram com o preto que prometeu plantá-los na sua horta.
Estou perdido sem os meus olhos.
Não consigo ter boca. Vou chegar atrasado a Roma.
A Terra era castanha, agora é azul escura.
O meu planeta era um planeta, um planeta. Daqui parece um lago, rodeado de ilhas que parecem estrelas, estrelas.
Sento-me, não sei para onde vou.
Esqueci-me.
Estou preocupado, quero que tu entendas.
Preciso que tu saibas.
Prova as minhas lágrimas, deves estar com sede.
Há um lugar em mim, cheio delas.
Nunca perdi uma.
Mas hoje entrego-te a chave da porta.
Para além dela, está esse lugar.
Dou-te tudo o que lá estiver.
É teu, são tuas, tuas.
Sou teu.
Desmonta-me, não preciso mais de mim.
Já não sou eu. Eu fiquei para trás.
O autocarro explodiu, tornou-se um sol.
Mas eu fiquei, não sabia disso.
Leva-me, desmonta-me.
Estes braços farão boas tentativas.
Toma estas duas mãos, aprenderão denovo as lições.
Os pés nunca se hão-de cansar.
Hão-de-se queixar, mas continuarão a andar.
Toma-me, eu não existo mais como dantes.
Não te importes, eu fico bem.
Tenho de fazer isto.
Eu sei que não posso voltar atrás.
Porfim, leva também esta cadeira.
Não me vou sentar mais nela.
Não tenho peso que sustentar.
Toma, adeus, adeus.
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